“Beleza? Mas tem beleza demais, no mundo.
Sons maravilhosos, odores indescritíveis, gostos inimagináveis, visões inenarráveis.
Beleza em contato, em crenças, em pensamentos, em construções, em imaginação.
Há mais beleza entre o céu e a Terra do que pode sonhar, ou consumir, nossa filosofia.
Agora, pro morto de fome, só tem mesmo uma coisa bonita –
a figura dourada, sexy, de um franguinho girando no espeto.”
Trecho de: Millor Definitivo, Millôr Fernandes
Desde o início de 2019 trabalho no Edifício Itália. Prédio icônico. Um escritório lindo e amplo com uma vista maravilhosa que só o centro de São Paulo é capaz de oferecer. Aliás, o centro de São Paulo é lindo, pena que haja tanto a fazer…
Bem, dizer que trabalho desde 2019 no centro de São Paulo não é exatamente uma verdade. Apesar de ser apaixonado pelas redondezas, desde que mudamos o nosso escritório para lá, até o momento de escrever estas linhas, passei muito mais tempo em casa fazendo o tal do home office que naquele lugar incrível.
Mas, aproveitando a trégua que as regras de isolamento começaram a oferecer, fui com minha esposa conhecer, bem perto do escritório, a Sorveteria do Centro. Quem ainda não foi, tem que ir conhecer. E voltar. Muitas vezes. Um lugar incrível que o casal Janaina e Jefferson Rueda criou dando mais um passo na batalha bonita que travam para revigorar o centro.
A Sorveteria do Centro conta ainda a luxuosa vizinhança do Hot Pork, lugar, também do casal Rueda, onde é possível comer um cachorro-quente, que só reitera a ideia de que o cachorro é realmente o melhor amigo do homem.
Paramos o carro na Major Sertório. Era sábado e tinha pequena feira naquele quarteirão.
Salivando em frente à sorveteria logo pensamos em procurar um lugar para um rápido almoço, assim poderíamos voltar o mais depressa possível para os prazeres gelados.
É claro que, para minha tristeza e de forma totalmente injusta, quando junto da Rita, as alternativas cachorro-quente e pastel da feira são sempre abolidas imediatamente.
Desvendando belezas
Vimos um lugar bem na frente de onde estávamos. Carlino Restaurante. Fachada tímida e acolhedora. Não resistimos. A proximidade só diminuiria nossa espera pela sobremesa.
Entramos. Para nossa surpresa salão cheio. Somente uma mesa vazia para nós. Tratamento simpático. Cardápio simples e convidativo. Carta de vinhos bastante enxuta, mas nada que pudesse comprometer um almoço não planejado e sem grandes expectativas.
Em resumo, um bom lugar para almoçar, não só nos fins de semana mas, um ótimo abrigo para as pausas dos dias intensos de trabalho.
A grande surpresa foi saber que o Carlino existe desde (pasmem) 1881. É o restaurante em atividade mais antigo da cidade de São Paulo.
Passei parte do almoço pensando.
Por que, mesmo estando há apenas uns poucos metros do escritório, eu não conhecia este lugar?
Quantos outros tantos lugares estão ali escondidos perto de nós esperando para serem descobertos?
Quantas descobertas não fazemos com um simples olhar mais atento?
Quando viajamos para qualquer lugar, seja perto ou longe, queremos saber tudo que há a nossa volta. Pensei que, dificilmente “perco” um museu quando estou fora de casa. Fazendo aqui minha confissão:
– Quantos belos museus de São Paulo eu ainda não fui visitar?
E o pior. Fazemos isto também com as pessoas ao nosso redor. Quanto talento oculto existe esperando para ser descoberto. Pessoas maravilhosas . A maioria das pessoas que conhecemos possuem talentos maravilhosos e nem nos damos conta disto.
A relação resume-se apenas à utilidade.
Sim, agimos na maior parte do tempo como o morto de fome que, só enxerga a beleza em um franguinho girando no espeto.
Enfim, terminando de digerir a comida junto com as reflexões, fomos tomar o tal maravilhoso sorvete.
E neste caso, sem surpresa nenhuma, era maravilhoso mesmo.
Os aprendizados e as lições de casa
Saio deste sábado com algumas lições de casa:
- Procurar sabedoria em um livro recebido como presente e deixado convenientemente na cabeceira (se é que ele já não recebeu um downgrade e foi parar na estante);
- Encontrar uma beleza oculta em um lugar que passo habitualmente e registrá-la nas redes sociais, assumindo e me orgulhando do meu provincianismo;
- Dedicar meu tempo para visitar um espaço cultural, destes lugares que constantemente estão nas conversas, mas raramente na programação e que eu certamente visitaria caso estivesse fora do meu habitat natural;
- Descobrir pelo menos um talento escondido de algumas pessoas com quem convivo e trazê-los à tona, da mesmo forma que foi feito comigo, me incentivando e recomendando que eu estivesse aqui escrevendo e roubando a sua atenção como leitor.
Saiba mais sobre Victor Cosme e sobre este espaço clicando aqui.
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